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As coisas que ele levou

  • Foto do escritor: Tabata Pitol
    Tabata Pitol
  • 26 de jul. de 2017
  • 3 min de leitura

Primeiro ele levou algumas roupas em uma pequena mala. Eu não estava em casa. Depois levou mais coisas - roupas, secador de cabelos, sapatos, etc - na minha mala. Para não ver a cena dele sair de casa, montei eu mesma a mala e deixei na garagem para que ele a pegasse. Mal sabia eu que o veria partindo - e levando coisas - inúmeras vezes, e que as lágrimas rolariam grossas em todas elas.

Ele voltou para pegar a televisão e o vídeo game. Depois levou uma mala cheia de roupas e lembranças da última viagem que fizemos. Aquela para comemorar os 10 anos de casamento. A outra mala fui eu quem fiz. Coloquei dentro tudo que ele gostava: um vinho, uma taça. A cafeteira, a xícara. Um porta-retrato com a foto mais doce e verdadeira da família que ele estava deixando para trás.

Duas semanas depois de descobrir que ele me traia há seis meses, ele levou as coisas que atirei no chão. Sem mala mesmo. Desceu do apartamento à garagem algumas vezes para colocar tudo no carro.

Na semana seguinte foi minha vez de levar tudo que restava dele em sacos de lixo para a casa da minha sogra. Foi ali, em meio a muita dor, desespero e a um quadro que comemorava os nossos 10 primeiros anos juntos, que eu disse para ela que, a partir daquele momento, eu não estava mais cuidando do filho dela, como eu prometera fazer há quase 10 anos. Junto com as coisas dele, ele levou algumas minhas também. E não estou aqui falando da minha escova de cabelo pink. De cara ele levou meus sonhos. Foi incrível perceber, em meio ao meu turbilhão de dor e desespero, que todos os meus sonhos envolviam ele.

Ele também levou minha autoestima. Levou minha confiança, a que eu tinha em mim e a que eu tinha no próximo. Levou meu otimismo, minha facilidade em acreditar nos outros. Levou minha coragem de me jogar de cabeça em um relacionamento. Levou minha capacidade de rir, dançar e sorrir. Levou as chaves de um apartamento que ainda hoje sofro para chamar de lar.

Levou as manhãs preguiçosas de domingo, as noites de conversa fiada na sacada. Levou o churrasco com os amigos das noites de sábado, e os churrascos que fazíamos a dois sem data marcada. Levou a vontade de provar e criar novos pratos com frutos do mar. Levou a alegria de uma noite fria assistindo Netflix.

Levou também o nosso restaurante favorito, e o cheiro que nunca achei ser possível viver sem. Levou meu menino lindo, aquele sorridente, tranquilo, generoso, amigo de todos, que só em mim parecida relaxar.

Levou o lugar onde eu melhor me encaixava e onde eu encostava para curar qualquer dor que se abatesse sobre mim. Levou 10 anos de amor, carinho, dedicação e admiração. Levou o pai dos meus filhos. Levou meu melhor amigo. O homem da minha vida.

A mala ele trouxe de volta. Assim como as chaves do apartamento, meu óculos de Sol, algumas coisas dos cachorros e muitas correspondências. No pacote, deixado na portaria sem nenhum aviso prévio, não veio um único bilhete, nenhum carinho ou afeto.

Acho que passou da hora de entender, de uma vez por todas, que algumas coisas só eu mesma poderei trazer de volta para mim.

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