Assinando os papeis

O pedido de casamento foi por telefone. Ao contrário do que muitos imaginam, foi romântico sim. Na medida certa, eu diria. Sem muita melação, com um pouco de loucura e impulso, adequados a um grande amor.

Embora "O Vestido Ideal" seja meu programa favorito na TV, nunca quis entrar de vestido branco bufante em uma igreja, e nem ir a um cartório, diante de testemunhas, afirmar que queria passar o resto da minha vida ao lado daquele homem. Eu sabia que eu queria e isso bastava.

O que eu disse ao meu pai, quando ele questionou a ausência dos papeis, foi: não quero ele comigo porque assinou um papel. Quero ele comigo enquanto ele quiser estar. Essa sempre foi a maior verdade.

Alguns anos depois, os papeis se tornaram necessários. Burocracias do plano de saúde nos fizeram declarar a um cara de um cartório que mantínhamos uma união estável com o objetivo de formar família. O "casamento" aconteceu na hora do almoço de uma terça-feira qualquer. Quando voltamos à redação (nessa época trabalhávamos juntos) um bem casado nos aguardava na mesa. <3

Por que então, na última semana, esses mesmos papeis foram a causa da maior tristeza que senti nos últimos 3 meses ?

Chegou a hora de assinar o fim da nossa união estável. Uffffffffffff...

Pensei muito se iria ou não. A princípio optei por não ir. Eu não precisava passar por isso! Já que não fazia questão do papel no começo, porque assiná-lo agora, no fim?

Conversei com o advogado - e também com a terapeuta - e decidi que faria uma procuração, para alguém ir no meu lugar. A certeza mudou quando o advogado me ligou e disse que tinha agendado a assinatura para o dia 17.

Eu nasci em um dia 17. Ele também. Casamos em um dia 17 e ele tatuou o número no braço. Achamos (pensando bem talvez só eu tenha achado) que o ano de 2017 seria o nosso ano perfeito (quanta ironia). Por isso, quando soube que as assinaturas foram agendadas para o dia 17, achei que devia estar lá. E estive.

Algumas horas antes, um e-mail, uma longa conversa ao telefone e algumas mensagens trocadas no whatsapp me fizeram ter a esperança de que aquele momento poderia ser adiado. Cancelado até. Não foi.

Ouvi o escrevente ler todo o documento para mim, me perguntando se eu tinha alguma dúvida. Vi ele imprimir no mesmo papel minha assinatura e a dele. Aquelas do arquivo, feitas no dia em que "nos casamos". Nossas assinaturas juntas, provavelmente pela última vez. Ele pediu para tirar uma foto minha (sério? Aquela 'rena do nariz vermelho' não me representa nos dias que não assino meu divórcio #ficaadica). Cada etapa parecia uma facada no meu corpo.

Às 14 horas do dia 17 de agosto de 2017, em meio a lágrimas grossas que saiam sem intervalo dos meus olhos e corriam ligeiramente pelo meu rosto sem se importar que mais de 10 pessoas me olhavam - algumas mostrando compaixão e outras, com sua indiferença, me fazendo entender que aquilo acontecia com grande frequência por ali - eu assinei o fim da minha união estável, o fim da minha intenção de formar uma família com o grande amor da minha vida.

Era assim que estava escrito no documento que assinei: não desejando mais os declarantes manter a união estável, declaram, de sua espontânea vontade, livres de qualquer coação, sugestão ou induzimento, que a convivência entre eles tornou-se indesejável, não havendo possibilidade de reconciliação. Neste ato, as partes reafirmaram a recusa de reconciliação, declararam perante o advogado e a este escrevente, estarem convictas de que a extinção da união estável é a melhor solução para ambos.

É... parece que eu estava convicta...pelo menos é o que o papel diz.

Entrei no Uber chorando muito. Sabe a tristeza que se sente quando um dementador suga sua felicidade nos filme do Harry Potter? Tenho certeza que agora sei exatamente qual é a sensação.

Encostei no ombro da amiga que estava comigo e chorei. Chorei, chorei e chorei. Não sei porque algo a que nunca dei valor me derrubou tanto. Não sei porque algo a que dei tanto valor acabou assim.

O lado bom? O motorista do Uber se compadeceu da minha dor e ganhamos mais um seguidor para esse canal...