A arte de solidarizar
- Rita Santander
- 29 de nov. de 2017
- 3 min de leitura

"Se a gente for junto, fica mais fácil.
Porque o mundo está precisando mais disso"
Ana Holanda
Há alguns meses, dias antes da melhor amiga sair para uma viagem longa pela Europa, desejada e planejadíssima, eu liguei para ela e comecei com um animado "E aí? Tudo bem?" Antes mesmo de eu mandar a piadinha sobre malas e Nutella que havia preparado, ela manda a bomba do outro lado: "Pôney maldito saiu de casa" (os nomes foram preservados para manter a privacidade dos mesmos, mas aqui, vamos chamar o ex dela assim, ok?). Eu fiquei sem chão. Eu, cheia das palavras de otimismo, não sabia o que dizer, mas não poderia deixar aquele vazio na linha, mandei um super produtivo e acolhedor "como assim?", estridente como é comum acontecer quando estou nervosa. "Ele saiu. Tá confuso, não sabe o que quer, disse que não tem outra (mentiu, o Pôney), falou que precisa de um tempo para ele". Pensei na hora no meu espanto e tristeza com aquilo. Aquele casal lindo e perfeito não estava mais junto. Mas engoli a minha dor e me coloquei lá para ouvir a dor dela, porque é isso que a gente faz quando o amigo sofre: solidariza. "E a viagem?", gritei, super útil nas palavras novamente. "Ainda não sabemos amiga. Talvez role, talvez não", falou ela, com as palavras mais tristes que já ouvi saírem da boca dela, visualizando o rosto inchado de chorar e o lábio que pronuncia e segura o choro ao mesmo tempo. "Quer que eu vá praí?" (Bom, agora fui proativa e útil). "Não, amiga. Preciso ficar sozinha", e desligamos. Foi assim que eu soube da separação da minha melhor amiga, a qual rolou muita lágrima e histórias à partir daí e eu fui expectadora (vocês também são, mas eu cheguei antes, desculpem). E eu cheguei antes, eu quis ir abraçar, eu quis estar perto e dizer palavras que fizessem a diferença e eu quis atender cada ligação quando ela precisou porque esse é o princípio da solidariedade para mim. Ser solidário, às vezes, é não dizer nada, porque às vezes não há o que dizer mesmo, mas significa estar lá para o que o outro precisa. É abrir mão da própria dor (porquê, sabe? Era triste pra mim também ver todo aquele sofrimento), para estar lá pela dor do outro. Porque ninguém está sofrendo mais que quem está passando por aquilo. Depois de toda a água que rolou embaixo dessa ponte, eu ainda estava lá. Fui com ela assinar o divórcio e, novamente, nunca a vi tão triste.
Eu fiquei triste? Claro! Mais que ela? Jamais...
Então, quando eu a abracei no táxi de volta para casa, e deixei que ela expurgasse seus demônios, eu também chorei por dentro, mas aquele era o momento dela... e eu não poderia sequer pensar em ofuscar aquilo, falando ou manifestando o meu desejo que o Pônei morresse por causar na minha amada amiga tanto sofrimento. Não naquele momento! Eu só estava lá para oferecer o calor do abraço. Claro que eu fiz isso de graça e por ela. Mas a retribuição a isso já tinha acontecido, anos antes, quando a mesma amiga foi solidária com a dor da minha própria separação. Ela tomou a dor para ela e sofreu em silêncio, para que eu pudesse, no colo dela, despejar minha tristeza. E é por essa razão que o Segue o Baile existe: para que sejamos, juntas, um grande abraço para quem está sofrendo com a dor de uma perda e superação. E por isso é importante também lembrarmos que temos umas às outras, assim como eu lembrei da melhor amiga e de várias outras melhores amigas quando me separei. O abraço e a solidariedade é o que nos une. Sigamos nessa direção ;)

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