Quando não ata e nem desata
- Juliana Pimenta
- 21 de fev. de 2018
- 4 min de leitura
Em um primeiro momento, quando o “casamento acaba”, muitos casais passam a viver o que se conhece no direito por separação de fato. É uma situação informal, diferente da separação judicial e do divórcio, na qual temos um distanciamento corporal e afetivo, que ocorre quando pelo menos um dos cônjuges decide não mais compartilhar a vida a dois. Algumas vezes acontece das pessoas até permanecerem residindo na mesma casa por algum tempo, mas já acabam dormindo em quartos separados, deixam de compartilhar objetivos de vida em comum e um passa a não interferir mais na vida do outro. Tá, mas e daí? Bem, e daí que essa situação se reflete no campo jurídico de diversas formas - e que tal reservarmos esse nosso espaço de hoje para conhecê-las? A mais importante delas, eu diria, está nos efeitos patrimoniais da separação de fato. Afinal, os bens adquiridos nessa fase são partilháveis ou não? Olha, a bem da verdade, a lei não diz. O Código Civil apenas dispõe que a separação judicial (que é feita por meio de um processo) põe fim ao regime de bens. Mas, calma... Apesar da omissão do legislador, vem se firmando o entendimento de que sim, a separação de fato põe fim ao regime de bens. Isso significa que os bens adquiridos após a data da separação, mesmo na ausência de uma decisão judicial, não se comunicam, ou seja, não são partilháveis. OK, mas se a lei não diz, de onde vem essa interpretação?

Bem, para entender precisamos falar de outros dois reflexos. Um deles é a permissão legal que uma pessoa casada, mas separada de fato, tem para constituir uma união estável com um terceiro (olha, para a lei, isso não é traição, tá?) Como a própria norma estabelece que o regime de bens padrão da união estável é o da comunhão parcial, caso ainda vigorasse o regime de bens do casamento, haveria um conflito desnecessário entre dois regimes de bens vigentes. Aí, imagina só o fuá na hora da partilha... Outro ponto é que com o fim do regime de bens é possível concluir que não há mais comunhão de vidas. Dessa forma, encerraram-se também os deveres de fidelidade mútua (opa!) e vida em comum no domicílio conjugal. Faz sentido não dividir com o ex o bens adquiridos depois que foi cada um para um lado, né? Então, querida leitora, fique tranquila para comprar o que quiser - sempre guardando as notas fiscais, boletos e comprovantes, por que, né, o seguro morreu de velho - e lembre-se sempre de que será necessário provar a data da separação de fato. Para isso valem e-mails, bilhetes, prints de mensagens (todos datados, viu?), declaração de testemunhas, posts em redes sociais e por aí vai… É importante se atentar a isso porque não é incomum ver gente sambando na partilha de bens por não conseguir provar a data da separação de fato, então é bem interessante não correr esse risco, né? #ficaadica A separação de fato também influi no plano sucessório. De modo geral, a lei dispõe que o cônjuge sobrevivente só terá direito à herança se, na data do falecimento do outro, ambos não se encontravam separados de fato há mais de dois anos. Com relação a isso, é importante não confundir meação, que é a parte pertencente a cada um no patrimônio conjunto, e herança, que se refere apenas aos bens (ou cotas) individuais dos cônjuges. A meação deve ser sempre respeitada, mas o direito à herança, como acabamos de ver, pode sofrer alterações. Por último, é interessante lembrar que o estado civil dos separados de fato não se altera: as pessoas continuam casadas. Ainda que ele não reflita a realidade efetiva do (agora, ex) casal, como a lei diz que o casamento válido só se dissolve pelo divórcio ou pela morte, até que um deles aconteça, as partes permanecerão casadas. Nem mais um minuto com você. Como nem sempre as coisas acontecem de forma pacífica, cabe falarmos um pouquinho sobre a separação de corpos, medida importante sobretudo para situações que envolvem violência doméstica e para aqueles que desejam afastar uma possível alegação de abandono de lar (tema que vamos abordar mais pra frente). A separação de corpos nada mais é que uma ação que pode ser ajuizada antes do divórcio, mas que pode ser também um pedido requerido liminarmente na ação principal. Dependendo do grau de urgência, da gravidade e das provas juntadas, o legal é que a decisão que determina o afastamento do outro do lar pode sair até mesmo sem que ele seja ouvido. Tecnicismos à parte, fato é que apesar dela não dissolver o casamento, ela põe fim aos deveres de coabitação e fidelidade e ao regime de bens, além de permitir pedido de alimentos do cônjuge dependente ao outro. O pulo do gato, entretanto, é que ela não só garante o afastamento do lar comum, como também pode ser ajuizada tanto por quem quer deixar a residência conjugal quanto por quem deseja afastar o outro do lar. Quando utilizada nos casos em que uma das partes sofre ameaças físicas e/ou psicológicas - e aí inclui-se apresentar riscos à prole do casal -, o afastamento do agressor se reveste de medida protetiva, devendo também ser fixados alimentos provisórios aos filhos menores ou incapazes, se houverem. Como nunca devemos esquecer que as provas são de grande importância no Direito, para fundamentar o pedido vale juntar, por exemplo, boletins de ocorrência, gravações (áudio/vídeo), bilhetes e mensagens com ameaças, ok? Sempre é tempo de recomeçar, sempre é tempo de retomar as rédeas da própria vida e trilhar um novo caminho e lembrar, nas palavras da Juíza Andrea Pachá, que: “O fim do amor não é o fim da vida, é o fim de uma história - e outras inúmeras histórias acontecem depois daquela.” E segue o baile.

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